"Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira." (TOLSTÓI, p. 17)
Esse é talvez um dos inícios mais famosos da literatura mundial e dá ao leitor a noção exata do que a obra se trata: uma narrativa sobre famílias infelizes, destruídas (ou não) pela traição e outros dilemas.
Apesar de ser uma estória com dezenas de personagens, o núcleo principal concentra-se em Anna Kariênina, Vrónski, Liévin e Kitty.
Anna é casada e tem um filho com o Kariênin e, no início da narrativa, é convocada pelo irmão, Stiepan, a visitá-lo. Stiepan é pego traindo sua mulher com a governanta e tem esperanças que Anna acalme os ânimos da cunhada. Ao chegar em Moscou, Anna se encontra na plataforma de desembarque com Vrónski e eles se encantam um com o outro instantaneamente (quase amor à primeira vista) e a visão de Anna causa uma profunda impressão nele. Essa cena é muito marcante e de fundamental importância à narrativa, pois os eventos que acontecem ali vão determinar o destino do casal.
"Penso [...] se há tantas cabeças quantas são as maneiras de pensar, há de haver tantos tipos de amor quantos são os corações." (TOLSTÓI, p. 146)
Kitty é irmã da mulher de Stiepan, e está sendo cortejada por Liévin e Vrónski ao mesmo tempo. Porém, ela tem uma clara preferência por Vrónski, já que ele tem uma posição social de mais status, enquanto Liévin é um senhor de terras. Apesar disso, o leitor já de início percebe qual dos dois tem intenções sérias e qual apenas quer diversão.
Liévin, por sua vez, é um dos personagens mais interessantes (ao meu ver e talvez por se assemelhar tanto ao próprio Tolstói) de toda a estória. Ele é de uma personalidade humilde, sensata e possui uma timidez que cativa o leitor e, ao ser rejeitado por Kitty em detrimento de Vrónski, tem uma das reações mais adoráveis e dignas de pena. Gostei muito dele, também, por ele ser de uma personalidade questionadora, principalmente no que tange a religiosidade e a fé. Muitas das indagações de Liévin são minhas, também, e isso me fez sentir uma carinho especial por esse personagem.
Por último, Vrónski, que apesar de ser objeto de desejo e afeição de Anna, não me despertou nenhum sentimento. A não ser raiva, no início. Apesar disso, ele representa para Anna o amor genuíno que ela não pôde ter quando mais jovem, por ter sido "obrigada" a casar-se com Kariênin. Apesar de o marido dar uma vida luxuosa para ela, era amor que ela precisava:
Mas para Kariênin, que a esposa o traísse à vontade, mas que não quebrasse o decoro, que não deixasse a sociedade saber, pouco se lixava para os sentimentos dela.
Por onde começar a falar desse livro? Poderia começar dizendo que amei e que não é uma leitura difícil, embora eu tivesse a impressão (errada) de que seria. Torci pelos protagonistas, sofri com eles e foi como se eu realmente estivesse vivenciando tudo aquilo. E isso só é possível quando nos deparamos com uma obra tão bem escrita quanto essa. Claro que teve momentos em que o ritmo da leitura se arrastou um pouquinho, mas não desmerece a experiência da leitura.
Um dos pontos que mais me chamou atenção é o tratamento diferenciado que Anna e o irmão recebem diante de suas traições. Enquanto Stiepan trai sua mulher repetidas vezes e é perdoado, não só pela mulher como pela sociedade russa, Anna é praticamente escorraçada e privada do convívio em sociedade. Claro que não quero dizer que o que eles fizeram foi certo, mas que, à época, isso era normal: a mulher precisava manter o decoro e os homens podiam fazer o que bem entendiam. Obviamente que esse é um dos temas principais do livro e não poderia deixar de comentar.
Outro ponto a ser comentado é a situação de Anna. Se por um lado todos reconheciam que a situação dela era infeliz, pois ao abandonar o marido precisou abandonar o filho e toda a vida que possuía, por outro lado nada faziam para ajudá-la e Anna sentia-se extremamente solitária em seu sofrimento, sem ter nenhum amigo a quem desabafar. E isso me fez pensar em quantas vezes conhecemos alguém e ignoramos o sofrimento dessa pessoa, por comodidade ou por pensar que nunca nos aconteceria o que acontece a ela. Isso mostra que há mais egoísmo no mundo do que pensamos e que esse individualismo se manifesta das mais variadas formas.
Acredito ser impossível eu fazer uma resenha decente para esse livro, faltam-me palavras e também existe a grande dificuldade de elogiar um livro e conseguir mostrar ao leitor porque gostei tanto da leitura, a ponto de convencê-lo a ler também. Só posso dizer que foi uma experiência de leitura muito diferente de todas as que tive anteriormente. Tolstói escreveu personagens tão maravilhosos nesse livro, considerando o enredo que já foi abordado em diversas outras obras, a traição, que fazem de Anna Kariênina um livro singular e leitura obrigatória para aqueles que apreciam um bom romance histórico. Além disso, por ter achado a linguagem acessível, recomendo para aqueles que querem conhecer um pouco a literatura russa. Obviamente, é uma leitura de fôlego, pois são mais de oitocentas páginas, porém, vale a pena.
Por fim, recomendo que leiam a resenha da Paula, do Caçando Ouriços, para conhecerem uma opinião extra sobre esse livro e, também, porque a Paula escreve as resenhas mais maravilhosas da galáxia.
Beijinhos, Hel.
TOLSTÓI, Liev. Anna Kariênina. Tradução e apresentação de Rubens Figueiredo. São Paulo: Cosac Naify, 2013. 816 p.
Liévin, por sua vez, é um dos personagens mais interessantes (ao meu ver e talvez por se assemelhar tanto ao próprio Tolstói) de toda a estória. Ele é de uma personalidade humilde, sensata e possui uma timidez que cativa o leitor e, ao ser rejeitado por Kitty em detrimento de Vrónski, tem uma das reações mais adoráveis e dignas de pena. Gostei muito dele, também, por ele ser de uma personalidade questionadora, principalmente no que tange a religiosidade e a fé. Muitas das indagações de Liévin são minhas, também, e isso me fez sentir uma carinho especial por esse personagem.
Por último, Vrónski, que apesar de ser objeto de desejo e afeição de Anna, não me despertou nenhum sentimento. A não ser raiva, no início. Apesar disso, ele representa para Anna o amor genuíno que ela não pôde ter quando mais jovem, por ter sido "obrigada" a casar-se com Kariênin. Apesar de o marido dar uma vida luxuosa para ela, era amor que ela precisava:
"Eu sou como uma pessoa faminta a quem deram o que comer. Talvez essa pessoa esteja com frio, e suas roupas estejam rasgadas, talvez sinta vergonha, mas infeliz não é." (TOLSTÓI, p. 196)
Mas para Kariênin, que a esposa o traísse à vontade, mas que não quebrasse o decoro, que não deixasse a sociedade saber, pouco se lixava para os sentimentos dela.
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Um dos pontos que mais me chamou atenção é o tratamento diferenciado que Anna e o irmão recebem diante de suas traições. Enquanto Stiepan trai sua mulher repetidas vezes e é perdoado, não só pela mulher como pela sociedade russa, Anna é praticamente escorraçada e privada do convívio em sociedade. Claro que não quero dizer que o que eles fizeram foi certo, mas que, à época, isso era normal: a mulher precisava manter o decoro e os homens podiam fazer o que bem entendiam. Obviamente que esse é um dos temas principais do livro e não poderia deixar de comentar.
Outro ponto a ser comentado é a situação de Anna. Se por um lado todos reconheciam que a situação dela era infeliz, pois ao abandonar o marido precisou abandonar o filho e toda a vida que possuía, por outro lado nada faziam para ajudá-la e Anna sentia-se extremamente solitária em seu sofrimento, sem ter nenhum amigo a quem desabafar. E isso me fez pensar em quantas vezes conhecemos alguém e ignoramos o sofrimento dessa pessoa, por comodidade ou por pensar que nunca nos aconteceria o que acontece a ela. Isso mostra que há mais egoísmo no mundo do que pensamos e que esse individualismo se manifesta das mais variadas formas.
"O mais importante é que eu não queria que pensassem que pretendo provar alguma coisa. Não quero provar nada, quero simplesmente viver; não fiz mal a ninguém, senão a mim mesma. Tenho esse direito, não tenho?" (TOSLTÓI, p. 605)
Por fim, recomendo que leiam a resenha da Paula, do Caçando Ouriços, para conhecerem uma opinião extra sobre esse livro e, também, porque a Paula escreve as resenhas mais maravilhosas da galáxia.
Beijinhos, Hel.
TOLSTÓI, Liev. Anna Kariênina. Tradução e apresentação de Rubens Figueiredo. São Paulo: Cosac Naify, 2013. 816 p.
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