"Raduan Nassar escreveu apenas dois livros e alguns contos, reunidos posteriormente, antes de abandonar a escrita há mais de trinta anos. Com esta breve porém decisiva obra, firmou-se como um dos maiores escritores de língua portuguesa e, mais de quatro décadas após sua estreia na literatura com Lavoura arcaica, romance publicado em 1975, continua sendo lido e estudado no Brasil e fora dele. Às edições nacionais seguiram-se estrangeiras e o reconhecimento da crítica internacional. Tendo sua obra traduzida para dez idiomas, e adaptada para o cinema mais de uma vez, Raduan Nassar foi nomeado para diversos prêmios.
Esta edição, revisada pelo autor, traz, além de Lavoura arcaica, Um copo de cólera e Menina a caminho, dois contos e um ensaio inéditos no Brasil, e conta também com extensa fortuna crítica e outros aparatos textuais que cobrem a vasta recepção a estes clássicos da ficção contemporânea." (Texto retirado do site da Companhia das Letras)
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Quando eu me deparei com esse livro, lançado no ano passado pela Companhia das Letras, em edição comemorativa de 30 anos da editora e na ocasião do Prêmio Camões recebido pelo autor, fiquei instantaneamente interessada em fazer a leitura. Ao finalizá-la, as impressões iniciais foram de que Nassar realmente merece o prestígio nacional e internacional que tem, bem como uma sensação de que fiz uma leitura superficial, no sentido de que é preciso me aprofundar melhor em alguns aspectos da escrita e dos temas abordados nos textos apresentados nessa edição para que eu pudesse chamar isso que vocês lerão de uma resenha. Em momento algum isso vai chegar perto de poder ser considerado uma resenha. Portanto, primeiro farei um comentário (breve) sobre os textos e, depois, um comentário sobre algumas coisas que me incomodaram nessa edição "definitiva".
De todos os textos, Lavoura Arcaica foi o que deixou uma impressão maior em mim. Cheio de referências bíblicas, esse romance é uma espécie de releitura da parábola do filho pródigo. O protagonista é um jovem que foge de casa e de um pai extremamente religioso, que constantemente pregava sermões à mesa, mas também foge de si mesmo. Logo no início da narrativa, eu já senti que algo muito (MUITO) errado havia acontecido. O narrador vai revelando, aos poucos, o dilema do protagonista e a escrita segue um fluxo muito rápido, com muitas vírgulas, ponto e vírgulas e quase nenhum ponto final, o que dá uma cadência incrível à narrativa e me fez ler quase ininterruptamente até o desfecho que é chocante.
"[...] ao contrário do que se supõe, o amor nem sempre aproxima, o amor também desune; e não seria nenhum disparate eu concluir que o amor na família pode não ter a grandeza que se imagina." (NASSAR, 2016, p. 170)
De Um copo de cólera eu esperei mais, por causa da maldita expectativa. Foi um texto muito recomendado por um amigo e também acredito que eu não tenha gostado tanto por conta de ter lido logo após Lavoura arcaica, que eu gostei muito. Protagoniza essa estória um casal que, ao início da narrativa, parecem apenas aproveitar a manhã depois de uma noite de amor. A estória toma um rumo totalmente diferente quando ele se irrita com o estrago que saúvas fazem na sua cerca viva e ela, ao tentar acalmá-lo, acaba provocando mais ainda sua raiva. O que até então fora uma relato de dois amantes tomando café da manhã, torna-se uma discussão em que ambos explodem e expõem o que pensam um do outro. E é aí que passamos a entender melhor esses dois personagens: percebemos que ele faz um estilo mais rude e retrógrado, um homem do campo; já ela, jornalista, mostra sua face de mulher das letras, preocupada em defender-se dos ataques (machistas) do parceiro. Arrisco a dizer que Nassar consegue exprimir com maestria uma nuance bruta da natureza humana.
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Algo que eu senti durante a leitura é que Nassar parece ser um escritor diferente a cada texto, não só o estilo narrativo muda, o modo como ele pontua, conduz a estória e, também, os temas abordados. Pode-se dizer que Nassar é um escritor multifacetado. Isso fica evidente com a leitura de seus contos e do ensaio que compõem essa edição.
Para encerrar esse meu comentário, gostaria de falar sobre algo que não exatamente me incomodou, mas que poderia ser melhor: a edição. Vejam, minha crítica aqui é à edição, já que a qualidade literária dos escritos de Nassar é irrefutável. Sendo assim, eis um dos pontos que me deixaram desapontada: a falta de textos de apoio. Nada é mais gratificante, para mim, do que abrir um livro e descobrir prefácios, posfácios e uma infinidade de notas de rodapés, isso torna a leitura mais rica a meu ver. Nesse caso, levando em conta o preço salgado desse livro (em torno de R$60), eu esperava mais do que uma lista de referências no final do livro (não desmerecendo a pesquisa, claro), quem sabe poderiam ter colocado um prefácio de alguém com propriedade para falar sobre a obra do Nassar, quem sabe...
O fato é que não é um livro extenso e daria tranquilamente para diminuir a diagramação, tamanho da fonte e margens e adicionar algum material extra.
Enfim, apesar dessa minha pequena insatisfação, indico fortemente a leitura desse livro. É uma oportunidade única de apreciar tudo que Raduan Nassar já produziu, já que não sabemos se e quando ele vai escrever mais alguma coisa, e essa também é uma bela edição de capa dura de tecido.
NASSAR, Raduan. Obra completa. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. 457 p.
Enfim, apesar dessa minha pequena insatisfação, indico fortemente a leitura desse livro. É uma oportunidade única de apreciar tudo que Raduan Nassar já produziu, já que não sabemos se e quando ele vai escrever mais alguma coisa, e essa também é uma bela edição de capa dura de tecido.
NASSAR, Raduan. Obra completa. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. 457 p.
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